sexta-feira, 28 de março de 2008

A Ponte

por Hugo Bernardo

Foi ao ler o artigo “Jumpers” (saltadores), escrito pelo jornalista do The New Yorker Tad Friend, que o documentarista Eric Steel teve a idéia de seu próximo projeto. O texto tratava de acontecimentos que se tornaram habituais para os que transitam pela ponte Golden State, na Califórnia, presenciarem; pessoas escolhem esse local para cometerem suicídios. E é isso que Steel pretende enfatizar no seu perturbador documentário A Ponte (The Bridge, EUA, 2006).




O problema inicial em trabalhar com esse tema é que nenhum governo gostaria de ter uma reputação dessas para seu maior patrimônio. Muito menos que alguém fizesse uma obra de impacto mundial apontando esse fato. Então, como o documentarista poderia obter uma licença para trabalhar seu tema? No caso de Steel, ele teve que mentir. E é aí que entra o primeiro embate ético que está ligado à obra. Ele disse para o comitê local que pretendia “filmar a poderosa e espetacular interação entre o monumento e a natureza”. Só depois de quase dois anos (as filmagens duraram todo o ano de 2004) que todos perceberam que foram enganados.

Com a liberação do governo local para realizar as filmagens, Eric Steel e sua equipe armaram diversas câmeras, em vários pontos diferentes do local. O cenário estava pronto. E, de acordo com as estatísticas (que apontam para um suicídio a cada quinze dias), o realizador teria bastante conteúdo para trabalhar em seu documentário. O que restava, então, era esperar. Mas, o que Steel esperava filmar é algo que, em termos éticos, é complicado assentir que é correto. Ele captava as pessoas se matando sem interferir nos atos. Isso é certo? Muita gente pode achar a idéia horrível demais e não se sujeitar a vê-la.

A idéia do documentário é querer explicar – a partir de amigos e familiares dos que se suicidaram na ponte – os fatos que levaram estas pessoas a tirarem suas próprias vidas. Há muito tempo que o suicídio fascina as pessoas; pode ser visto como um ato híbrido entre medo e coragem. O estilo de Steel de abordar o tema na obra é interessante. Ele não dá bola para alguns artifícios típicos do documentário – como a narração em off ou sua presença conduzindo as entrevistas (ele nunca aparece na projeção) –, o cineasta opta, na verdade, por tentar captar o “real” sem camadas, de forma crua e direta. No filme isso é traduzido na maneira despretensiosa que ele constrói as seqüências dos acontecimentos, do jeito que eles se desenvolveram originalmente.

O documentário começa com o que aparenta ser um dia normal na Califórnia. Pessoas e carros transitam a ponte Golden State e, lá embaixo, surfistas alçam pequenos vôos com o kite surf (um tipo de surf que usa pipas). Então, a câmera pousa num homem que contempla o lugar. Ele parece ser uma pessoa normal; usa um boné vermelho e camisa verde, aparência tranqüila. No momento seguinte, ele dá um rápido salto pelo pequeno muro de proteção e se joga. A queda é filmada na integra. Tudo isso em menos de cinco minutos de projeção. Daí dá pra perceber que as imagens que veremos no filme não são de fácil assimilação.

Um dos casos interessantes narrados pelo filme foi um salvamento forçado de uma quase-suicida. Richard Waters estava tirando fotos na Golden State, quando percebeu que uma mulher havia pulado o muro de proteção e estava prestes a cometer suicídio. Waters, então, revela que seu primeiro impulso foi de tirar fotos dela. “Quando eu estava atrás da câmera, era como se aquilo não fosse real”, explica. O interessante dessa idéia do rapaz é a possibilidade de traçar um paralelo com o próprio filme. Estamos vendo cenas impactantes e perturbadoras, mas por estarem filtradas pela câmera, o impacto do “real” acaba um pouco diluído.

Dentre os vários suicidas daquele ano (2004), Eric Steel escolheu um “personagem principal”. Gene usa camisa e calças pretas, óculos escuros e um longo cabelo preto. Em determinado momento, aprendemos, a partir de uma de suas amigas, que também as cortinas, paredes e lençóis em seu quarto eram pretos. “Era como se ele não quisesse contraste”, analisa. Ao longo da projeção o vemos andando de um lado pro outro da ponte, ao som de depoimentos de alguns amigos. Steel tenta compor um quadro de características de seu “personagem”, por quem aparenta ter certa afeição. Só que o trabalho acaba ficando distante e impessoal; não existe empatia, sentimos apenas pena de uma pessoa deveras perturbada.

E é isso que parece conectar essas pessoas; a melancolia. Todos carregam dentro de si problemas de relacionamento, depressão e outros transtornos. A música de Alex Heffes transpira esse sentimento. Os tons são, além de melancólicos, solitários. É uma trilha que capta bem a idéia proposta pelo tema do filme. Só que não é uma obra ficcional, e sim um documentário. A oposição a esse tipo de artifício (a música), dos mais ferrenhos defensores desse gênero, está no fato de que ela não cabe numa obra que se proponha representar a realidade tal como a vivemos. Quando andamos na rua, entramos num carro ou, no caso do filme, pulamos de uma ponte, não existe um piano leve no fundo que tenha o propósito de emocionar espectadores.

Fica a impressão, depois do filme, que o documentarista não fez nada de extraordinário no documentário. As imagens que ele captou são chocantes, mas ele dá a elas apenas uma idéia de espetáculo. Steel não aborda a facilidade que as pessoas têm de se suicidar na ponte Golden State, tampouco debate o suicídio em si. Parece mais uma oportunidade gratuita de trazer à tona uma discussão mórbida sobre o ato de filmar pessoas cometendo um fascinante e perturbador ato.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Palestra Mariana Baltar

Às 19h de amanhã (terça), o Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFPE oferece, em seu auditório, uma palestra com Mariana Baltar, doutora em comunicação pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Ela vai falar sobre “Realidade Lacrimosa - documentário e melodrama em narrativas contemporâneas”, enfocando documentários como “Ônibus 174” (José Padilha), “Um Passaporte Húngaro” (Sandra Kogut) e “Edifício Máster” e “Peões” (ambos de Eduardo Coutinho).

Fonte: Luiz Joaquim (Folha de Pernambuco - 24.03.08)

sexta-feira, 21 de março de 2008

Cursos de cinema

A Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) divulgou nesta semana o cronograma de cursos técnicos do Centro Técnico Audiovisual do Nordeste (CTAV-NE). A partir de abril, o centro realizará oficinas de capacitação para o crescimento da atividade cinematográfica na região. Todas serão gratuitas e ministradas por profissionais de diversas partes do país.

Para se inscrever, os candidatos devem enviar um e-mail com o currículo para ctavne@fundaj.gov.br e ctavne@gmail.com. Os alunos serão selecionados pelos professores de cada curso e a divulgação será feita pelo site da Fundaj www.fundaj.gov.br e pelo site da Fundarpe www.cultura.pe.gov.br ou www.fundarpe.pe.gov.br.

Lista de cursos:

ASSISTÊNCIA DE CÂMERA 35mm (curso 1)

Professor: Hamilton Oliveira – BA
Hamilton Oliveira é um experiente diretor de fotografia com trajetória no cinema e na televisão, suas últimas realizações em longa foram os filmes Esses Moços, de José Araripe, Eu Me Lembro, de Edgard Navarro. Além de ter ministrado vários cursos e oficinas de formação na área.

Objetivo do curso: Qualificar como Assistentes de Câmera em 35 mm, profissionais que já atuem no mercado audiovisual regional, facilitando a realização de produções locais, que precisam trazer de fora esse profissional tão importante para a produção cinematográfica. O seu conteúdo programático vai desde noções básicas de iluminação para cinema, a câmera de cinema, foco e movimentos de câmera até os procedimentos de filmagem.

Inscrição: 18 a 29 de Março de 2008
Resultado: 01 de abril de 2008
Realização do curso: 7 a 12 de Abril de 2008
Número de Vagas: 15

CHEFE DE ELETRICISTA – LIGHTING GAFFER

Professor: Álvaro Brito - SP
Álvaro Brito é chefe de eletricista, iluminador, professor de iluminação do Senac SP e consultor técnico. No audiovisual trabalhou em diversos filmes, entre eles Alice, de Chico Teixeira e De Passagem de Ricardo Elias.

Objetivo do curso: Essa capacitação vem preencher uma importante lacuna na formação do profissional Chefe de Eletricista - Lighting Gaffer na região, que se encontra em desvantagem em relação à capacitação de outras funções. Estão previstas aulas práticas e teóricas com a utilização de equipamentos necessários no dia-dia dos melhores profissionais de elétrica no audiovisual da atualidade.

Inscrição: 31 de Março a 5 de Abril de 2008
Resultado: 8 de Abril de 2008
Realização do curso: 14 a 19 de Abril de 2008
Número de Vagas: 10

DESENHO DE SOM – CAPTAÇÃO

Professor: Nicolas Hallet - Bélgica
Nicolas Hallet é diretor, roteirista e técnico de som, formado em Cinema e Vídeo na Academie de Beaux Arts de Bruxelles, na Bélgica. Ministra cursos de captação de som desde 1999 no Brasil. Já trabalhou em dezenas de filmes, dentre eles: Pau Brasil, de Fernando Bélens; KFZ 1348, de Gabriel Mascaro e Marcelo Pedroso, recebeu o prêmio de melhor som no Festival Cine Ceará de 2005 pelo áudio do filme Entre Paredes, de Eric Laurence.

Objetivo do curso: Aprimoramento dos profissionais de áudio da região e tratará de conteúdos que vão desde a arte da captação até noções de física do som e acústica, o processo de gravação e suas adversidades, a importância de um projeto sonoro e a passagem do analógico para o digital.

Inscrição: 21 a 26 de Abril de 2008
Resultado: 29 de Abril de 2008
Realização do curso: 5 a 10 de Maio de 2008
Número de Vagas: 15

MONTAGEM

Professora: Karen Harley – PE
Karen Harley é pernambucana radicada no Rio de Janeiro, realizadora e montadora de cinema. Montou, entre outros, os filmes: Cinema, Aspirinas e Urubus, Baixio das Bestas, Janela da Alma, Hercules 56 e a A Festa da Menina Morta.

Objetivo do curso: Aprofundar o conhecimento sobre montagem cinematográfica e analisar a sua importância para a construção da narrativa do filme. Serão dadas aulas teóricas, com apresentação de trechos de filmes para apreciação e análise e aulas práticas em programa de edição não linear, Final Cut Pro.

Inscrição: 21 a 26 de Abril de 2008
Resultado: 30 de Abril de 2008
Realização do curso: 5 a 9 de Maio de 2008
Número de Vagas: 15

ASSISTÊNCIA DE CÂMERA 35mm (curso 2)

Professora: Andréa Scansani – SC
Andréa Scansani é Diretora de Fotografia; Formada pela ECA/USP em Cinema e Vídeo com especialização em Fotografia Cinematográfica; Especialização em Cinematografia na Escola de Drama e Cinema de Budapeste, Hungria; mestranda no Instituto de Artes da Unicamp, Docente do curso de Cinema da Universidade Federal de Santa Catarina; Ministrante do curso de assistência e operação de câmera desde 2000.

Objetivo do curso: O segundo curso de Assistência de Câmera em 35 mm tem como proposta traçar uma visão completa das funções do assistente e operador de câmera relacionando-o com a equipe de fotografia, e tratará desde as noções básicas de fotografia e formação da imagem, passando pela instrumentalização técnica do equipamento a ser utilizado. E a parte prática: montagem e desmontagem da câmera e acessórios, testes filmados de estabilidade e paralaxe, pratica de movimentos e acompanhamento de foco, carregar e descarregar chassi, organizar o material sensível, organizar o equipamento para retirada e devolução na locadora e analisar os resultados dos testes.

Inscrição: 28 de Abril a 3 de Maio de 2008
Resultado: 6 de Maio de 2008
Realização do curso: 12 a 19 de Maio de 2008
Número de Vagas: 15

DESENHO DE SOM – FINALIZAÇÃO

Professor: Armando Torres
Armando Torres é sound designer e trabalhou em diversos filmes como: Meu nome não é Johnny, Tropa de Elite, O Passado, Cidade dos Homens, Baixio das Bestas, O ano que meus pais saíram de férias, Cinema, aspirinas e urubus, O cheiro do ralo, Amarelo Manga, Lavoura Arcaica, e em diversas obras para televisão, como a mini-série A Pedra do Reino.

Descrição do curso: A capacitação em Desenho de Som - Finalização será um básico de edição de som para cinema e televisão, destacando os itens: desenho de som para cinema, mixagem para cinema e televisão, diferenças entre mixar para cinema e mixar para televisão e os sistemas de exibição para cinema: Dolby Digital-Dolby Sr-Thx-Sdds e Digital Cine.

Inscrição: 30 de Junho a 5 de Julho de 2008
Resultado: 8 de Julho de 2008
Realização do curso: 14 a 18 de Julho de 2008
Número de vagas: 15

CENOGRAFIA PARA CINEMA

Professor: Carlos Arthur Liuzzi- RJ
Carlos Arthur Liuzzi é arquiteto, fotógrafo, cenógrafo e diretor de arte com ampla formação acadêmica e experiência profissional. No cinema, fez a direção de arte de filmes como Matou a família e foi ao cinema, de Neville de Almeida e Lembranças do Futuro, de Ana Maria Magalhães. Na televisão fez a direção de arte do seriado Mulher e no Teatro a cenografia de O Analista de Bagé, de Paulo César Pereio, só para citar alguns exemplos.

Metodologia do curso: Irá tratar da formação da imagem moderna: arte-fotografia-cinema, cinema e realidade, cinema e teatro, arquitetura e cenografia, cenografia como força dramática, decupagem para um projeto cenográfico, mobiliário - iluminação e objetos de cena e a formação da equipe de cenografia. Além da execução de um projeto cenográfico para cinema, pondo em prática a matéria teórica comentada em sala.

Inscrição: 7 a 12 de Julho de 2008
Resultado: 15 de Julho de 2008
Realização do curso: 21 de Julho a 2 de agosto de 2008
Número de Vagas: 32

segunda-feira, 17 de março de 2008

Jogo de Cena

Representação ou realidade? O gênero documentário ainda carrega a polêmica entre ficção e verdade. Em “Jogo de Cena” (2007), Eduardo Coutinho não foge à regra, acrescenta ao propor uma mescla de atuação, interpretação e realidade. O 10º longa-metragem do diretor convoca mulheres para participar do filme por meio de um anúncio de jornal. O classificado resultou na seleção de 23 das 83 inscritas. Em junho de 2006, as personagens escolhidas contaram algum fato relevante de suas vidas. A história foi contada duas vezes, uma por elas e outra por atrizes, que interpretaram os depoimentos aos seus modos três meses depois.


As situações relatadas são extremamente emotivas. Com as cadeiras do Teatro Glauce Rocha (RJ) ao fundo, mulheres de personalidades divergentes contam histórias peculiares. As atrizes, algumas renomadas como Andréa Beltrão, Fernanda Torres e Marília Pêra, recontam os momentos e, fica ao cargo do telespectador descobrir quem é personagem e quem é atriz. O jogo é difícil, já que Coutinho consegue deixar todas à vontade em frente às câmeras. As atrizes, principalmente de rostos menos conhecidos, deixam o público sem saber se ela é a personagem ou se está interpretando. Fica ainda mais complexo quando o documentarista extrai das atrizes algo além da atuação e representação: histórias de vida delas mesmas.


Numa das cenas, Andréa Beltrão conta sobre a saudade que sente da sua babá. Marília Pêra mostra o cristal japonês que utiliza para passar próximo aos olhos quando necessita das lágrimas nas filmagens. Já Fernanda Torres relata a sua ida a um terreiro de candomblé. Fernanda, inclusive, revela que não consegue interpretar a situação real que lhe foi entregue. “A diferença é que com um personagem fictício, se você atinge um nível medíocre, você pode até ficar ali nele porque ele é da sua medida. Com o personagem real, a realidade um pouco esfrega na sua cara onde você poderia estar e você não chegou”, diz.


Em cento e cinco minutos de duração, o filme vai além do que a situação demonstrada poderia proporcionar. Os aspectos do documentário estão interligados e contribuem para o jogo de cena. Um exemplo disto é o ambiente escolhido para gravação. Nos palcos, que são utilizados para a interpretação, os papéis são invertidos. Ali, mulheres anônimas, que geralmente ocupam a platéia, ganham destaque ao contar histórias emotivas. Já as atrizes, que estão acostumadas a utilizar o teatro para atuar, fazem a vez de platéia a partir do momento em que deixam a atuação de lado e se aproximam do público ao relatar situações reais.


Mesmo apresentando traços utilizados na ficção, como o uso de atrizes, Coutinho não deixa sua forte característica documental, torna o longa-metragem transparente como sempre fez em trabalhos anteriores. Porém, neste, o diretor aposta no universo feminino para relatar histórias sensíveis. E consegue emocionar, seja através da realidade ou da ficção.

sexta-feira, 14 de março de 2008

Festivais movimentam meses de março e abril

É Tudo Verdade e a Conferência Internacional do Documentário debatem o gênero documental

O 13º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade acontecerá em São Paulo (dias 26 de março a 6 de abril), Rio de Janeiro (27 de março a 06 de abril) e Brasília (14 a 20 de abril). Neste ano serão abordadas a nova safra do documentário brasileiro – com 18 longas e médias inéditos e 12 curtas-metragens –, o melhor da produção mundial no gênero e retrospectivas: Experimental Brasileiro/Filmes que abalaram o mundo. As inscrições, gratuitas, são através do site É Tudo Verdade
.



A 8º Conferência Internacional do Documentário, que abordará o Documentário Experimental, também vai ocorrer em abril, nos dias 2, 3 e 4, no Sesc da Avenida Paulista, em São Paulo. O evento busca refletir sobre o gênero documental, com a proposta de apontar rumos de pesquisa e mobilizar a comunidade científica e artística em torno de importantes questões. A participação nos debates é gratuita.

Programação:

Lançamento Oficial: 15 de março
Abertura para Inscrições: 20 de março

Dia 2 de abril
10h - Panorama histórico do documentário experimental
14h30 - Novos territórios do documentário

Dia 3 de abril
14h30 - O documentário experimental no Brasil: Glauber Rocha, Rogério Sganzerla e Andrea Tonacci

Dia 4 de abril
10h - O documentário experimental no Brasil: Arthur Omar, Cao Guimarães e Carlos Adriano
14h30 - A visão do realizador: um diálogo com Jorgen Leth


terça-feira, 11 de março de 2008

Para quem já tem uma idéia na cabeça

Com o intuito de promover a democratização ao acesso dos recursos públicos, a Secretária de Audiovisual do Ministério da Cultura – Sav/MinC - vem realizando uma série de concursos para premiar e incentivar a diversidade da produção audiovisual no Brasil. Os editais para os concursos são divulgados periodicamente e promovem tanto o fomento aos setores tradicionais como estimulam iniciativas para a diversidade de conteúdos e meios audiovisuais criando, dessa forma, pólos de produção. Estabelecem-se também pontes de cooperação entre países, permitindo a inserção da periferia e pequenos municípios no domínio de novas tecnologias audiovisuais.O Gedoc está de olho e vai publicar a cobertura completa de todos os principais concursos ligados à produção Audiovisual no Brasil. Confira desde já a abertura de editais. Agora só falta a câmera na mão.

Curtas BH

Já estão abertas as inscrições para o 10º Festival Internacional de Curtas de Belo Horizonte (MG) cujas categorias são de mostra competitiva nacional e internacional. O prazo de inscrição vai até 14 de março, estarão sendo aceitos filmes de todos os gêneros (exceto comerciais e institucionais), concluídos entre janeiro de 2004 e fevereiro de 2008 e com duração mínima de 30 minutos. O festival acontece de 25 a 31 de julho, no Cine Humberto Mauro e exibirá um panorama da produção de curtas metragens no Brasil e no exterior. Inscrições e outras informações na página eletrônica: www.festivaldecurtasbh.com.br.

Seleção para Cuba

A seleção para a Escuela Internacional de Cine e Television, de Santo Antônio de Los Baños (Cuba) já está com as inscrições abertas. Estão sendo oferecidos vagas para cursos de documentário, som, produção, monstagem, fotografia, direção e roteiro. Poderão participar da seleção, brasileiros com idade entre 22 e 28 anos. Assim como no ano passado, as inscrições para moradores do Nordeste será realizada no Recife nos dias 4 e 5 e abril. Para mais informações acessar o site www.pagina21.com.br.

Revelando os Brasis III

O programa Revelando os Brasis tem o objetivo de promover inclusão e formação audiovisuais através do estímulo à produção digital de vídeos. É dirigido a moradores de municípios brasieleiros com até 20 mil habitantes e tenta contribuir para formar receptores críticos que produzam obras que resgatem e registrem a diversidade cultural do Brasil. Para acessar o regulamento e a ficha de inscrição de projetos, acesso o site do programa : www.revelandobrasis.com.br.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Ônibus 174

Por Rodrigo Carreiro
www.cinereporter.co
m.br

“Ônibus 174”, um dos mais contundentes documentários da safra 2002 no Brasil, cumpre o duro papel de puxar o espectador desavisado de volta à realidade social do País. O longa, dirigido pelo estreante José Padilha, provoca raiva, aflição, indignação. Oferece um panorama social acurado e, por que não dizer, desolador do Brasil contemporâneo. É uma espécie de “Cidade de Deus” sem humor, sem glamour, sem atores. Assisti-lo é (ou deveria ser) uma espécie de dever cívico de cada brasileiro. Ainda que menos por méritos cinematográficos e mais pelo conteúdo social.

O filme trata de um episódio especialmente marcante de violência cotidiana: o seqüestro de um ônibus lotado em plena zona sul (um dos espaços urbanos mais chiques) do Rio de Janeiro. O episódio, ocorrido na tarde do dia 12 de junho de 2000, durou pouco mais de quatro horas. Poderia ter sido apenas mais um ato de violência urbana a cair na vala comum do esquecimento, se não tivesse sido transmitido, ao vivo e em cadeia nacional, para todo o Brasil. Ao todo, 60 milhões de espectadores pararam para assistir ao teatro de violência promovido pelo ex-menino de rua Sandro do Nascimento, então com 22 anos. O rapaz manteve duas dezenas de passageiros sob a mira de um revólver, com o ônibus estacionado na rua e cercado por duas centenas de policiais militares.

“Ônibus 174” reconstitui minuciosamente a tragédia. O diretor José Padilha opta por uma investigação à moda jornalística, procurando dar voz a todos os lados da questão (policiais, meninos de rua, sociólogos, reféns) e tentando manter alguma distância crítica, sem julgamentos morais ou éticos daquilo que é visto. Mas também vai mais longe do que uma simples reportagem, porque busca em duas linhas alternativas de narrativa, que são intercaladas à reconstituição do seqüestro em si, a contextualização da história de Sandro dentro de um panorama mais amplo da violência em território nacional. Ou seja, faz uma reportagem extensa e bem apurada.

A primeira narrativa paralela reconstitui a trajetória do seqüestrador. A biografia do rapaz realmente impressiona: era um menino de rua que viu a mãe ser assassinada a facadas, aos seis anos, e depois sobreviveu ao massacre na igreja da Candelária, em 1992, na noite em que policiais à paisana mataram oito crianças que dormiam nas escadarias do local. O trabalho jornalístico é correto. José Padilha ouve vários amigos que perambulavam com Sandro na época, parentes, vai atrás da ficha criminal do rapaz, visita os lugares onde ele esteve preso.

Na segunda linha secundária de narrativa, o esquadro se amplia e o filme assume um tom claramente mais ambicioso, numa tentativa de explicar a existência de casos como o de Sandro dentro de um contexto social abrangente. Tudo isso é feito com coragem. A tese-chave do filme parece ser narrada pelo sociólogo e ex-secretário de Segurança do Rio, Luiz Eduardo Soares: a sociedade está imersa num contraditório fenômeno em que produz ela mesma a miséria e tenta criar formas - algumas pacíficas , outras violentas - de varrê-la para baixo do tapete, transformando excluídos em homens “invisíveis”. As cenas em que os motoristas cariocas ignoram solenemente as crianças pedintes, tão banais, soam dilacerantes. Todo cidadão de classe média passa por isso diariamente. Fingimos que não vemos os garotos que passam ao lado do carro, a cada avenida, a cada sinal. São fatos corriqueiros (e lamentáveis) em qualquer grande cidade nacional.

Tudo isso são méritos do filme, mas há problemas. “Ônibus 174” resulta muito longo. A reconstituição parece excessiva e enfatiza um clima de suspense que poderia não existir – a função do filme é menos narrativa e mais de denúncia, certo? As imagens, amplamente conhecidas, acabam diluídas em meio a um emaranhado de depoimentos que se entrelaçam. Individualmente, são entrevistas articuladas e interessantes, mas perdem impacto quando apresentadas coletivamente. José Padilha ainda tenta imprimir um tom detetivesco à narrativa, segurando até o fim a conclusão dos fatos (já conhecida). Pior: não explica, e nem tenta, como o seqüestro começou. Autoridades policiais de alta patente, bem como políticos, também não são ouvidos. Certamente não quiseram falar, mas isso não é dito ao espectador em momento algum.

O uso da música também resulta meio equivocado. Se o filme é narrado em tom sóbrio, há várias seqüências em que tenta emocionar o espectador a partir da combinação de imagens violentas com canções tocantes. Nada disso era necessário, pois a brutalidade teima em pipocar na tela. Há um punhado de momentos realmente chocantes em “Ônibus 174”, momentos que enfatizam o abismo social que divide uma classe média assustada, acuada, e uma periferia violenta, sem esperança. Nesse sentido, o filme cumpre o objetivo, descortinando o processo de construção da “estratégia de invisibilidade” montada, inconscientemente, pela própria burguesia. É essa estratégia que nos faz aceitar uma polícia ineficaz, desaparelhada, destreinada e violenta, posta em xeque (novamente) pelo filme.

O melhor momento, porém, está nas cenas e depoimentos em que explica o comportamento dúbio do seqüestrador. Para as câmeras de TV, Sandro vira um perfeito demônio; está apenas atuando, algo que os depoimentos dos reféns deixam claro. Dentro do ônibus, ele encenou várias situações de violência e chegou a simular o assassinato de uma garota. São lembranças impressionantes, que atingem o nervo ciático do problema: o papel da mídia, especialmente da televisão, na perpetuação dessa violência física, moral e espiritual perpetrada pela classe média contra os moradores da favela. A mídia espetaculariza a violência, e mesmo aqueles que não sabem soletrar essa palavra, como Sandro, sabem o que isso significa. Pode-se até discutir a linguagem de “Ônibus 174”, mas não o conteúdo.

Premiado em vários festivais ao redor do mundo, o filme de José Padilha levou três anos para aperecer no mercado de home vídeo. A distribuidora LK-Tel lança o disco com falhas grotescas. Para começar, a versão tem 15 minutos a menos do que a exibida no cinema. Além disso, perde também as legendas nos trechos em que o seqüestro é mostrado ao vivo (o áudio é incomprrensível) e os créditos que informam o papel de cada entrevistado no caso. A LK-Tel reconhece a mancada e promete lançar a versão integral do produto, com comentário em áudio do diretor e cenas cortadas, nos próximos meses.


- Ônibus 174 (Brasil, 2002)
Direção: José Padilha e Felipe Lacerda
Documentário
Duração: 133 minutos

sexta-feira, 7 de março de 2008

Documentário de Eduardo Coutinho em cartaz

O novo trabalho de Eduardo Coutinho – Jogo de Cena – vai pré-estrear neste sábado (8) às 20h30, no Cinema da Fundação. Neste filme, Coutinho convoca mulheres para contar histórias de suas vidas, algumas delas atrizes (Fernanda Torres, Marilia Pera), que reinterpretam alguns dos depoimentos verdadeiros. Depois de um tempo, o espectador terá dúvidas sobre quem realmente diz a verdade e quem interpreta.

O Cinema da Fundação fica na Rua Henrique Dias, 609, Derby. O ingresso custa R$ 6,00 inteira e R$ 3,00 para estudantes e pessoas acima de 60 anos.